Lei da “Ficha Limpa”: inelegibilidade e renúncia - 1
O Plenário, ante o empate na votação, manteve acórdão do Tribunal Superior Eleitoral - TSE que, ao enfatizar a aplicabilidade imediata das alterações introduzidas pela LC 135/2010, concluíra pela inelegibilidade de candidato a cargo de Senador da República. O acórdão impugnado assentara a inelegibilidade do candidato para as eleições que se realizassem durante o período remanescente do mandato para o qual ele fora eleito e para os 8 anos subseqüentes ao término da legislatura, nos termos da alínea k do inciso I do art. 1º da LC 64/90, acrescentado pela aludida LC 135/2010 [“Art. 1º São inelegíveis: I – para qualquer cargo: ... k) o Presidente da República, o Governador de Estado e do Distrito Federal, o Prefeito, os membros do Congresso Nacional, das Assembléias Legislativas, da Câmara Legislativa, das Câmaras Municipais, que renunciarem a seus mandatos desde o oferecimento de representação ou petição capaz de autorizar a abertura de processo por infringência a dispositivo da Constituição Federal, da Constituição Estadual, da Lei Orgânica do Distrito Federal ou da Lei Orgânica do Município, para as eleições que se realizarem durante o período remanescente do mandato para o qual foram eleitos e nos 8 (oito) anos subsequentes ao término da legislatura.”]. Considerara o fato de o candidato ter renunciado a mandato de igual natureza, em 2001, após o oferecimento de representação capaz de autorizar a abertura de processo por infração a dispositivo da Constituição. Na espécie, passados 9 anos da data da renúncia e tendo sido o candidato eleito, nesse ínterim, Deputado Federal, por duas vezes, a ele fora negado o registro de sua candidatura às eleições de 3.10.2010. No presente recurso extraordinário, alegava-se ofensa: a) ao princípio da anualidade eleitoral (CF, art. 16); b) aos princípios da segurança jurídica e da irretroatividade das leis (CF, art. 5º, XXXVI); c) ao art. 14, § 9º, da CF, pois a cláusula de inelegibilidade em questão não se amoldaria aos pressupostos constitucionais autorizadores de novas hipóteses de inelegibilidade e d) ao princípio da presunção de inocência ou de não-culpabilidade (CF, art. 5º, LVII).
RE 631102/PA, rel. Min. Joaquim Barbosa, 27.10.2010. (RE-631102) Parte 1 - Parte 2
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O Min. Joaquim Barbosa, relator, na linha do voto proferido no julgamento do RE 630147/DF — em que reconhecida a repercussão geral da matéria —, desproveu o recurso. Inicialmente, salientou que apreciaria o caso a partir da perspectiva de valorização da moralidade e da probidade no trato da coisa pública, sob uma ótica de proteção dos interesses públicos e não dos puramente individuais. Em passo seguinte, rejeitou a assertiva de ofensa ao art. 16 da CF. Afirmou que a norma adversada não se inseriria no campo temático de processo eleitoral e que a “Lei de Inelegibilidade” não se qualificaria como lei de processo eleitoral. Consignou que as condições de elegibilidade seriam examinadas na data do registro da candidatura, sendo que a lei em comento fora publicada antes do período fixado para a realização das convenções partidárias, de modo a inexistir surpresa ou quebra ao princípio da isonomia para os partidos políticos. Repeliu, de igual maneira, o argumento de ofensa ao art. 5º, XXXVI, da CF, ao fundamento de que a referida lei complementar não teria aplicação retroativa, mas concedera efeitos futuros a fatos desabonadores praticados no passado. Enfatizou que retroação ocorreria se os cargos exercidos posteriormente à renúncia do recorrente tivessem sido declarados nulos. No que concerne ao art. 14, § 9º, da CF, assinalou haver expectativa do corpo eleitoral de que os parlamentares não venham a renunciar, configurando a renúncia um ato desabonador do candidato, o qual demonstraria não se preocupar com seu eleitorado. Ademais, registrou que a norma em comento teria dado concretude à opção constitucional pela avaliação da vida pregressa do candidato. Por fim, relativamente ao art. 5º, LVII, da CF, asseverou que inelegibilidade não seria pena ou punição e não caracterizaria repercussão prática da culpa ou do dolo do agente político, mas uma reprovação prévia, anterior e prejudicial às eleições, por comportamento objetivamente descrito como contrário às normas de organização política. Acompanharam o relator os Ministros Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Ayres Britto e Ellen Gracie.
RE 631102/PA, rel. Min. Joaquim Barbosa, 27.10.2010. (RE-631102) Parte 1 - Parte 2
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Em divergência, os Ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Cezar Peluso, Presidente, ao também reiterar posição firmada no julgamento do aludido RE 630147/DF, proveram o recurso. Reputaram que a lei complementar repercutira em inúmeros julgamentos no processo eleitoral. Acrescentaram que a alínea k da citada LC 135/2010 não seria fruto de iniciativa popular, mas resultado de emenda a projeto de lei. Registraram que, quando da renúncia do recorrente em 2001, dentre as conseqüências previstas para tal ato, não havia a inelegibilidade e que uma lei posterior não poderia buscar um fato pretérito para dele extrair conseqüências no presente. Realçaram que a concessão de eficácia retroativa à lei implicaria aplicação casuística e personalizada. Observaram que, na situação dos autos, após a renúncia, o recorrente obtivera da Justiça Eleitoral o deferimento dos registros e respectivas diplomações nas 2 eleições seguintes, sendo o candidato a Deputado Federal mais votado no Brasil. Indagaram como, à época, ele seria elegível e atenderia às formalidades legais e, nos dias atuais, considerado inelegível para exercer mandato, por essa mesma Justiça Eleitoral, tendo em conta aquela mesma renúncia que não o impedira de exercer os cargos de parlamentar federal. Assim, entendiam que a norma impugnada teria atribuído a um ato lícito um caráter de ilicitude para efeito de privação da elegibilidade passiva, haja vista que a inelegibilidade, dessa forma, configuraria sanção de direito eleitoral restritiva do exercício ao direito fundamental de participação política. Concluíram que a interpretação conferida pelo TSE afrontaria não só o postulado fundamental inscrito no art. 16 da CF, bem como aquele que busca prestigiar a incolumidade de situações já consolidadas no passado.
RE 631102/PA, rel. Min. Joaquim Barbosa, 27.10.2010. (RE-631102) Parte 1 - Parte 2
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Em seguida, o Plenário rejeitou questão de ordem suscitada da tribuna pelo patrono do recorrente no sentido de suspender o julgamento até a nomeação de novo Ministro para compor o Tribunal. A defesa informava a peculiaridade das eleições no Estado-membro pelo qual concorrera o recorrente, porquanto lá haveria outro candidato ao Senado Federal com idêntica causa de inelegibilidade, cujo processo estaria aguardando apreciação pelo TSE. Considerou-se que o exame do processo deveria prosseguir para que o impasse fosse solucionado e efetivada a prestação jurisdicional. Vencidos os Ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Marco Aurélio que acolhiam o pleito de suspensão para evitar decisões díspares. O Min. Cezar Peluso fez ressalva de sua posição pessoal. Dessa forma, deliberou-se sobre a existência de critérios impessoais, objetivos e apriorísticos para a resolução do empate. Por maioria, acatou-se proposta formulada pelo Min. Celso de Mello para que fosse aplicado, por analogia, o inciso II do parágrafo único do art. 205 do Regimento Interno do Supremo e, com isso, mantida a decisão recorrida (“Art. 205. ... Parágrafo único. O julgamento de mandado de segurança contra ato do Presidente do Supremo Tribunal Federal ou do Conselho Nacional da Magistratura será presidido pelo Vice-Presidente ou, no caso de ausência ou impedimento, pelo Ministro mais antigo dentre os presentes à sessão. Se lhe couber votar, nos termos do art. 146, I a III, e seu voto produzir empate, observar-se-á o seguinte: ... II – havendo votado todos os Ministros, salvo os impedidos ou licenciados por período remanescente superior a três meses, prevalecerá o ato impugnado.”). Considerou-se a presunção de legitimidade dos atos estatais e o fato de que esse critério já teria sido adotado no julgamento da ADPF 46/DF (DJe de 26.2.2010). O Min. Celso de Mello salientou que a sugestão poderia ser adotada sem prejuízo da convicção de cada membro da Corte, haja vista que em discussão a superação do impasse. Foram rejeitados outros critérios, tais como o voto de qualidade do Presidente (RISTF, art. 13, IX), a convocação de Ministros do STJ e o art. 146, caput, do RISTF. Vencidos os Ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Marco Aurélio, que determinavam a aplicação do voto de qualidade do Presidente.
RE 631102/PA, rel. Min. Joaquim Barbosa, 27.10.2010. (RE-631102) Parte 1 - Parte 2
» Informativo 606 do STF - 2010
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